domingo, 27 de maio de 2012

Gosto...de gostar de mim!




Gosto… de gostar de mim!



Gosto… das coisas simples, como eu

Gosto …da transparência ao invés da escuridão

Gosto… de observar e ver

Gosto… de tocar e sentir

Gosto… de dar e ter prazer

Gosto… de dar e receber



Gosto… de quem gosta de mim!

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Para um amigo de coração grande!


Não sei explicar!!



Não deixa de ser estranho

Não deixo de ter medo

Mas foi um ganho

Talvez, ainda um segredo



Trocamos a palavra

Trocamos sentimentos

Sentimentos, como terra lavrada

Trocamos, também tormentos



E se dessa troca

Resultar esperança?

Então que troquemos

Que troquemos, perseverança

abastança, festança, pujança,

e que a amizade perdure na

confiança!

Só sei ...que era um qualquer domingo


Só sei…que era domingo, não sei a data, nem precisar o mês, mas tenho a  certeza que era primavera. As andorinhas povoavam os telhados anunciando a chegada do calor e mostrando que o inverno já tinha virado as «costas», elas voltavam sempre a ocupar os ninhos construídos no ano anterior ou se por acaso nós os houvéssemos destruído construiriam um novo, sempre perto do qual onde haviam nascido, estas aves davam alegria e cor à cidade e nós miúdos muito gostávamos da sua chegada e daquilo que ela representava. O bom tempo, o sol, os dias maiores, propícios a mais brincadeira.



A minha mãe ajudou-me a tomar banho e deu-me para eu vestir a melhor roupa que eu tinha, umas calças azuis escuras, um pulôver de decote em bico, também azul, uma camisa aos quadrados, já muito russa de ter sido lavada muitas vezes. As calças e o pulôver, havia trazido de casa dos patrões, tinham pertencido ao filho mais novo. Era hábito a patroa dar-lhe a roupa que já não servia aos filhos. Eram mais velhos do que eu. Aliás! Eu só vestia roupa usada dos filhos do advogado ou de outros.



Depois de pronto disse-me que eu ia ter uma surpresa:



− Hoje vais conhecer o teu pai!



 Fiquei pouco entusiasmado, não me fazia falta, nunca o tinha visto. Apenas tinha visto uma fotografia sua, quando uma vez «bisbilhotei» a carteira da minha mãe.



Sentia alguma pena de não ter pai para partilhar as alegrias e os fracassos e até jogar à bola, como alguns dos meus amigos faziam, mas já estava habituado, quando eu perguntava ela sempre me dizia que estava em viagem e que não sabia quando voltava, há muito que tinha deixado de perguntar.



Depois de ambos estarmos prontos, saímos em direcção ao Rossio, fomos direitos à pastelaria Suíça. Quando nos aproximámos da esplanada a minha mãe disse:



 – Olha! O pai está ali á nossa espera!



Quando o vi, pensei: – Não é o meu pai, é gordo de bigode e careca, o meu pai até pode já estar gordo, mas não era careca e não tinha bigode, portanto aquele fulano não é de maneira nenhuma o meu pai.



− Xavier dá um beijinho ao pai  – disse a minha mãe quando chegámos. Com pouca vontade lá dei um beijo ao Senhor.



− Sentem-se aqui. Estava à vossa espera. O que querem comer? Vamos lanchar e depois daremos uma volta por aí  – disse o desconhecido.



Sentámo-nos os três à mesa, o pretendente a meu «pai» bebia uma cerveja, a minha mãe pediu para cada um de nós, um galão e um queque. Como me soube bem aquele bolo…devo tê-lo comido em duas dentadas. Há quanto tempo não comia um bolo!



Quando acabámos de comer, tomamos os três a direcção do Terreiro do Paço, depois…fomos até à beira do Tejo. Quando aí chegados, sentámo-nos um pouco a ver os pescadores lançarem as suas canas na tentativa de apanharem algum peixe. Era engraçado ver os homens colocarem o isco na ponta da cana e lançar o mais longe que conseguiam, na esperança que algum peixe mordesse o anzol. Havia um pescador que já tinha um balde com água com uns quantos peixitos lá dentro, levantei-me e fui observá-los, alguns, ainda mexiam, outros, apenas boiavam no cimo da água, lembro-me que fiquei com pena, coitadinhos... corria uma aragem fresca na margem do rio, os cabelos da minha mãe nesse dia estavam soltos e com o vento a soprar-lhes estavam despenteados, assim, ficava mais bonita. Pouco falaram comigo, fui brincando na sua frente, andando ao pé-coxinho, mandando umas pedrinhas a alguns passaritos que pousavam no passeio, andavam uns meninos de bicicleta, fiquei com pena de não ter uma também...

Será outro? Talvez!



A minha mãe havia nascido numa aldeia perto de Lamego, tinha vindo para Lisboa por intermédio de umas pessoas conhecidas, para servir como empregada interna na casa de um advogado. Jovem, ingénua e com pouca formação, após algum tempo de namoro com um rapaz que trabalhava no porto de Lisboa, engravida. No dia que lhe dá a notícia…soube que era casado. Na última vez que se encontraram, o meu pai colocou-lhe no bolso umas quantas notas. E disse-lhe:


− Não, estragues a tua vida e a minha, vai tirar isso!

As dúvidas, o medo, a insegurança e a solidão encontraram espaço para entrar e permanecer durante muitos anos. A dor de saber que não ia poder compartilhar a gestação, e muito menos o nascimento, não a demoveu...após, muitas noites sem dormir, muitas perguntas sem resposta, muitas incertezas…, decidiu. Ia dar à luz este filho.

   Quando os patrões deram pelo «sucedido»; disseram-lhe que podia lá continuar a trabalhar, mas assim que a criança nascesse deveria arranjar sitio onde dormir. Pouco antes de eu nascer, não teve outro remédio…senão, procurar, um local onde pudéssemos os dois viver.

Nasci, onde quase todas as mães davam à luz, no «aviário» de Lisboa, a Maternidade Dr. Alfredo da Costa. Ela tinha acabado de fazer vinte anos, alta e magra, de cabelos compridos pretos, olhos castanhos grandes, apesar de não ser feia, tinha um ar pouco cuidado.

 Passámos a viver, num quarto subalugado, nas águas furtadas, dum prédio muito antigo e já com alguma degradação, numa rua estreita e íngreme ao lado do Hospital de S. José. A escada era tão escura e tão a pique que muitas vezes subíamos de gatas.

Desde que partira da terra natal, nunca mais tinha ido visitar a família. Escrevia de vez em quando, nem os meus avós sabiam quem era o meu pai e até pensavam que vivíamos os três.


A velhota, a D. Joaquina que nos tinha subalugado o quarto, enquanto fui pequeno também tomava conta de mim, mas agora estava muito velhinha, já precisava era de quem tomasse conta dela! O que ela queria era que eu me sentasse ao seu lado, no sofá da sala, com uma mantinha pelas pernas a fazer-lhe companhia. Ela via todas as telenovelas e queria que eu fizesse o mesmo, mas eu, não achava nenhuma piada aquelas histórias.

Vezes sem conta…ficava sozinho, empoleirava-me em cima de um banco na pequena janela, e tentava contar os carros que avistava no largo do Martins de Moniz, levava comigo uma folha de papel e uma caixinha de lápis de cor e usava o parapeito da janela para fazer risquinhos das suas cores e tentava contá-los por cores.



Era um garoto franzino, de cabelos pretos, olhos grandes, carente, muito carente de bens e de afecto.

Desilusão!


Era madrugada

Acordei estremunhada

Pouco compreendi

Só horas mais tarde percebi



Depois foi a alegria

Mais tarde a euforia

Logo a seguir a esperança

Depois veio a mudança



Os anos foram passando

Com avanços e recuos fomos andando

Rindo e chorando

Muitas vezes vibrando



Tantos anos passados

Tantas lutas ignoradas

Tantas esperanças sufocadas

Tantas lágrimas derramadas…



Estamos encurralados…

Pela desilusão, pela humilhação

Pela desgovernação

Pelos abutres tentaculados.




Teu peito!



Planície…

salpicada de branco

Não tem neve

Não tem geada

Não está gelada

Pulsa

Respira

Transpira



Branca…

Foi do tempo

Tempo que não é tempo

Mas que sopra como o tempo

E foge como o vento

E arde como a chama…


Excertos da "Fonte das Escadinhas"


Numa das pontas do casario de não mais de uma dúzia de casas, no cimo do monte, com uma vista deslumbrante, avistava-se de um lado a serra de Sintra, e, do outro, Lisboa. À noite, podiam ver-se, através do grande vale, pequenas luzinhas que mais pareciam estrelas. Estas eram as luzes eléctricas da grande cidade ali tão perto, mas que ao mesmo tempo ficava a tantas horas de caminho.



No cimo da serra de Sintra, lá estava o imponente Palácio da Pena. Na aldeia, conheciam-no apenas como Palácio de Sintra, sem terem a mais pequena noção da sua importância ou riqueza. Era simplesmente bonito. Da verde Sintra vinham as queijadas, estas eram-lhes mais próximas.



Lisboa era uma cidade que começava a acordar ao som dos pregões, na sua maioria trazidos pelos saloios que a abasteciam. Havia muito que o alfacinha se habituara a não dispensar aquelas gentes, que formavam um tipo sui generis de graça e cor. Sempre polémico o tema da cultura saloia, a disputa entre próximos, alfacinhas[1] e saloios[2] e a ideia preconcebida de que o saloio é descendente de árabes e de mouros. O que ficava deste registo era sobretudo a imagem negativa do camponês, a figura do saloio associada a uma população dos arrabaldes antigos de Lisboa. Todavia, estes habitantes não eram em nada distintos dos minhotos, dos estremenhos ou dos alentejanos dos primeiros tempos do século, tendo uma conotação desajustada da realidade pelos letrados que sobre eles escreviam e que com eles conviviam, esquecendo-se muitas vezes de que eram estas gentes laboriosas e «moiros de trabalho» que alimentavam a cidade.



Hoje, numa dinâmica de «cidade alargada», onde já não se define onde termina a cidade e onde começam os seus concelhos limítrofes, o rasto bem vincado do saloio dos anos 20 até aos anos 50 perdeu-se. Agora, são os concelhos que reclamam essa identidade e tudo fazem para não perderem a sua cultura e as suas tradições.



Viviam naquele aglomerado de casinhas caiadas de branco menos de uma dúzia de famílias. Casas feitas de pedra e barro, na maioria térreas, simplesmente cobertas de telha, onde o frio entrava teimosamente por entre os seus intervalos. Aquando do silêncio da noite, o vento assobiava com tanta força que metia medo. Existiam apenas duas habitações que tinham sobrado. Sem luz, sem água, o lume era a fonte de energia para as pessoas se aquecerem e cozinharem. Os mais novos buscavam nos pinhais a lenha, um bem essencial. Todos precisavam dela e por essa razão a sua escassez era disputada.



Nem sequer existia uma mera taberna onde os homens pudessem juntar-se e falar das agruras das suas vidas. Votados ao isolamento e à plena miséria.



Numa madrugada invernosa do mês de Outubro de 1921, os galos cantavam nas capoeiras, algumas chaminés ainda deitavam um ténue fumo de algum tronco maior que havia ficado a arder durante a noite, o pó estava assente pela chuva, mas ainda se sentia o cheiro característico da terra molhada. A chuva parara, mas corria uma brisa fresca que transportava o cheio a eucalipto. E que bem sabia esse cheiro purificador e refrescante a entrar pelas narinas!



As lavadeiras já se preparavam para carregar as suas trouxas de roupa à cabeça, os poucos homens e rapazes da aldeia já tinham partido de enxada às costas para começarem um árduo dia de trabalho.



O farnel dos homens tinha sido preparado de véspera contendo apenas pão, um pequeno queijo seco de cabra, duas petingas fritas e uma garrafita de vinho. Serviria para a alimentação de um dia inteiro. Eram dias duros de trabalho. Desde que amanhecia até ao pôr-do-sol e estavam apenas protegidos da chuva e do frio por uma saca de serapilheira que levavam pela cabeça. Nos dias chuvosos a saca chegava a pesar quilos devido à água que já tinha ensopado.  



As hortas forneciam diariamente à grande cidade quase todos os bens frescos. Fizesse sol ou chuva era preciso trabalhar e raros eram os homens que tinham outra possibilidade de trabalho que não a agricultura.



As mulheres, de joelhos todo o dia sobre as presas de água, que eram retidas do ribeiro no fundo do vale, tinham uma cobertura feita de madeira e de telha, que as protegia do sol e da chuva e ainda umas canas em volta a servir de paredes, para as proteger do vento. Mesmo em pleno Verão, embora com menos abundância, havia uma pequena nascente na serra que alimentava aquelas presas. Era ali que as lavadeiras da aldeia passavam o dia inteiro para ganharem o seu «pão».



Transportavam à cabeça ou em burros as trouxas de roupa desde a aldeia até ao lavadouro e, depois de lavada, faziam o percurso inverso. As carroças não passavam da aldeia. O lavadouro ficava no fundo do vale e o seu acesso era feito por carreiros estreitos e sinuosos. E que dificuldade era subir e descer aqueles caminhos! Durante o Verão, faziam-no pela manhã antes do calor e, no fim do dia, pela fresca. O pior era de Inverno, quando a chuva teimava em não parar e o vento empurrava quase sempre ao contrário do que era preciso, os pés escorregavam na lama e quantas vezes a trouxa lhes caía da cabeça e a roupa tinha de voltar aos lavadouros. As freguesas queriam a roupa lavada e seca, não se importando se era Inverno ou Verão.



         Os joelhos eram protegidos pelas joelheiras, utensílios feitos em madeira, compostos de fundo, frente e dois laterais que protegiam os joelhos e o vestuário da água.



         Quando a roupa chegava em trouxas de Lisboa, primeiro era separada por diferentes tipos: branca, de cor, lençóis, fronhas, toalhas e peças mais delicadas. A branca e a mais suja iam primeiro para a barrela ― uma mistura de sabão, cinzas e água quente que ficava em pias de pedra ou em grandes alguidares de barro, de um dia para o outro. Depois da barrela, era dada uma pequena lavagem, sendo posta ao sol a corar, e de vez em quando era borrifada para não encarquilhar. Seguidamente ia de novo a lavar, ficando assim limpa e desencascada.



Às filhas das lavadeiras, ainda crianças, eram dadas a lavar as peças mais pequenas e soltas. A roupa era estendida a secar por cima das moitas dos carrascos pela serra. Lavar e estender fazia-se durante a semana e normalmente ao domingo dobrava-se e separava-se a roupa em trouxas a fim de a entregar às senhoras no dia seguinte.



A roupa estava marcada com iniciais ou marcas próprias de cada família, não havendo lugar a trocas. Conceição era uma das inúmeras lavadeiras que havia na região, que, com as duas filhas de tenra idade, passava toda a semana naquelas lides.



 A entrega era feita à segunda-feira quase sempre a pé, desde o Largo de Martim de Moniz até aos vários pontos da cidade, havendo algumas excepções onde passava o eléctrico. O transporte até Lisboa fazia-se em carroças ou galeras puxadas por mulas ou machos, que saíam à noite, de modo a estarem de madrugada no local da distribuição e voltarem ainda no mesmo dia. O valor pago pelas freguesas por cada peça maior rondava os três tostões.



Era uma vida dura, com toda a certeza. Mas o respirar do ar puro do campo, o chilrear dos pássaros, o silêncio apenas interrompido pela água do riacho que corria junto às pedras que serviam de lavadouros para esfregar a roupa, as cantigas ao desafio e a própria rivalidade entre as lavadeiras ajudavam a esquecer a dureza do trabalho. E os mexericos? Esses eram o prato forte das conversas, o diz-que-disse ou as lascarinhices, como as gentes saloias lhes chamavam. Também a disputa da água ou dos carrascos mais soalheiros, geravam por vezes discussões.



[1] Os de Lisboa.
[2] Os dos arredores de Lisboa.

Se eu fosse capaz!


Se eu fosse capaz!

Ah! Se eu pudesse…

Afiar a faca

Soltar a matraca

Dizer o que penso

Fazer o que acho…

Ah! Se eu fosse capaz…

De fazer o que penso

De dizer o que acho

De espetar a faca

De abrir olhos…

Ah! Se eu fosse capaz…

De tirar as vendas

Aos que não querem ver

E… de abrir a cabeça

Aos que não pensam…

Ah! Se eu fosse capaz…