quinta-feira, 24 de maio de 2012

Só sei ...que era um qualquer domingo


Só sei…que era domingo, não sei a data, nem precisar o mês, mas tenho a  certeza que era primavera. As andorinhas povoavam os telhados anunciando a chegada do calor e mostrando que o inverno já tinha virado as «costas», elas voltavam sempre a ocupar os ninhos construídos no ano anterior ou se por acaso nós os houvéssemos destruído construiriam um novo, sempre perto do qual onde haviam nascido, estas aves davam alegria e cor à cidade e nós miúdos muito gostávamos da sua chegada e daquilo que ela representava. O bom tempo, o sol, os dias maiores, propícios a mais brincadeira.



A minha mãe ajudou-me a tomar banho e deu-me para eu vestir a melhor roupa que eu tinha, umas calças azuis escuras, um pulôver de decote em bico, também azul, uma camisa aos quadrados, já muito russa de ter sido lavada muitas vezes. As calças e o pulôver, havia trazido de casa dos patrões, tinham pertencido ao filho mais novo. Era hábito a patroa dar-lhe a roupa que já não servia aos filhos. Eram mais velhos do que eu. Aliás! Eu só vestia roupa usada dos filhos do advogado ou de outros.



Depois de pronto disse-me que eu ia ter uma surpresa:



− Hoje vais conhecer o teu pai!



 Fiquei pouco entusiasmado, não me fazia falta, nunca o tinha visto. Apenas tinha visto uma fotografia sua, quando uma vez «bisbilhotei» a carteira da minha mãe.



Sentia alguma pena de não ter pai para partilhar as alegrias e os fracassos e até jogar à bola, como alguns dos meus amigos faziam, mas já estava habituado, quando eu perguntava ela sempre me dizia que estava em viagem e que não sabia quando voltava, há muito que tinha deixado de perguntar.



Depois de ambos estarmos prontos, saímos em direcção ao Rossio, fomos direitos à pastelaria Suíça. Quando nos aproximámos da esplanada a minha mãe disse:



 – Olha! O pai está ali á nossa espera!



Quando o vi, pensei: – Não é o meu pai, é gordo de bigode e careca, o meu pai até pode já estar gordo, mas não era careca e não tinha bigode, portanto aquele fulano não é de maneira nenhuma o meu pai.



− Xavier dá um beijinho ao pai  – disse a minha mãe quando chegámos. Com pouca vontade lá dei um beijo ao Senhor.



− Sentem-se aqui. Estava à vossa espera. O que querem comer? Vamos lanchar e depois daremos uma volta por aí  – disse o desconhecido.



Sentámo-nos os três à mesa, o pretendente a meu «pai» bebia uma cerveja, a minha mãe pediu para cada um de nós, um galão e um queque. Como me soube bem aquele bolo…devo tê-lo comido em duas dentadas. Há quanto tempo não comia um bolo!



Quando acabámos de comer, tomamos os três a direcção do Terreiro do Paço, depois…fomos até à beira do Tejo. Quando aí chegados, sentámo-nos um pouco a ver os pescadores lançarem as suas canas na tentativa de apanharem algum peixe. Era engraçado ver os homens colocarem o isco na ponta da cana e lançar o mais longe que conseguiam, na esperança que algum peixe mordesse o anzol. Havia um pescador que já tinha um balde com água com uns quantos peixitos lá dentro, levantei-me e fui observá-los, alguns, ainda mexiam, outros, apenas boiavam no cimo da água, lembro-me que fiquei com pena, coitadinhos... corria uma aragem fresca na margem do rio, os cabelos da minha mãe nesse dia estavam soltos e com o vento a soprar-lhes estavam despenteados, assim, ficava mais bonita. Pouco falaram comigo, fui brincando na sua frente, andando ao pé-coxinho, mandando umas pedrinhas a alguns passaritos que pousavam no passeio, andavam uns meninos de bicicleta, fiquei com pena de não ter uma também...

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